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Exposição: De Ponto a Ponto

De Ponto a Ponto - Adel Souki
De Ponto a Ponto - Adel Souki
De Ponto a Ponto - Adel Souki
De Ponto a Ponto - Adel Souki
De Ponto a Ponto - Adel Souki
De Ponto a Ponto - Adel Souki
De Ponto a Ponto - Adel Souki
De Ponto a Ponto - Adel Souki
De Ponto a Ponto - Adel Souki
De Ponto a Ponto - Adel Souki
De Ponto a Ponto - Adel Souki
De Ponto a Ponto - Adel Souki

 

De Ponto a Ponto - 2012

 

Quando aqui chegou, o libanês Halim Souki trouxe consigo sua formação em humanidades pela Universidade Americana de Beirute e um olhar fotográfico que rendeu à nossa cidade parte de sua certidão de nascimento. Homem de tradição, traduziu o que fora dispersado para sempre de sua terra natal. Seu vínculo com o lugar de origem e suas tradições foram negociadas com a nova cultura, através de suas fotografias. Um homem de cultura hibrida, não procurava por uma pureza local mas, antes, traduzir, transferir ou transportar entre fronteiras. Homens traduzidos são assim, aprendem a habitar duas identidades, a falar duas ou mais linguagens culturais, a negociar e transitar entre elas. Talvez seja essa a questão que profundamente permeia as obras de Adel Souki: a transição ou o trânsito. Legado do pai. Pois, enquanto imigrante, ele mantinha a sua identidade suspensa entre diferentes posições. Suas fotografias nos falam desse índice. As lentes de Halim Souki tecem tessituras entre o sagrado e o profano: o carnaval, as procissões, as paradas e desfiles, o reinado... Seu trânsito não é o de imobilizar as relações de poder, mas de colocar em movimento os corpos e os espíritos dessa realidade.

Na exposição Ponto a Ponto, Adel Souki evoca esse índice, mas agora ela dá prosseguimento a uma experiência-limite, transpõe para as fotografias suas intervenções com linhas e pequenos retalhos da origem do pai, da terra que não habitou. Ora caminha em direção à unidade ou à fusão — ora em oposição ao profano, ao pecado, por tamanha coragem. Não busca se autoafirmar através do pai, ao contrário, despe-se de si, aniquila-se, desapropria-se da experiência interior para buscar outra dimensão: a poética do trânsito.  

“A terra de meu pai estava mais dentro de mim do que podia imaginar”, disse Adel por ocasião da primeira visita ao Líbano, à Jordânia e à Síria. Buscava sua ancestralidade, quando constatou a origem de seu trabalho na cerâmica: casas, túmulos, edifícios, muros — cavados na pedra há mais de 12 mil anos. Era uma provocação conhecer lugares em tempos oportunos, ela tinha medo de ser ouvida e de querer o que não pedia! Viver de pequenas mutações e de insignificantes deslocamentos de trânsito implicaria não deixar as coisas pela metade. Manter esse discurso amoroso seria tão difícil quanto alcançá-lo. O trânsito se configura nesses pequenos deslocamentos, entre um e outro, no entremeio, sempre presente suscitando sinais e gestos.

Ao se apropriar das fotografias do pai, Adel traz uma concepção da verdade vestida, que se torna visível num ver-não-ver, numa imagem-não-imagem, realizando o trânsito entre o visível e o invisível, entre a veste e o que ela cobre, um jogo de assinalar ocultamente o que não deve ser mencionado, apenas indicado. Neste jogo de ocultação e desvelamento, há um olhar livre que, para transgredir, se despe. Pois, só assim, descobriremos o elo que une a veste e o nu, a verdade e sua ocultação. A ação decisiva de Adel nas fotografias não é um obstáculo ao olho nu, ao contrário, traz a condição de toda visão possível.

Neste trabalho “Ponto a Ponto”, Adel procura uma conexão com o que viveu e viu, através do olhar do pai; obriga-se a trazer o que está ausente, torna visível o que é meramente espiritual. Esta transitividade espiritual é semelhante ao que Klossowski propõe em As leis da hospitalidade: “só dando para os outros vestirem um corpo que nos pertence é que podemos continuar a vê-lo na sua exterioridade indumentária”.

Assim como o pai, Adel nos coloca em movimento. Avançamos e recuamos, ocultamos e desesperadamente desvendamos, respiramos e expiramos juntos, num trânsito para muito além da memória e do presente.

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